Toda quinta era a mesma coisa. Sim, quinta-feira! Na quinta, ela sentia quase o mesmo entusiasmo que a maioria das pessoas tem na sexta. Já na sexta, tinha a sensação de estar vivendo um “meio-sábado”, ou algo como um “quase-fim-de-semana”. (possuía uma forma bem peculiar de se relacionar com o mundo)
Ligou o computador.
Antes que a ela pudesse sequer segurar o mouse, seu ruíndows travou.
- Ah, tá! Era só o que me faltava... – falou rosnando, enquanto digitava diversas vezes as apoteóticas teclas “CTRL ALT DEL”, sem sequer aparecer ao menos a silhueta da tela do ‘desorganizador de dispositivos’.
Depois de xingar toda a família do Zill Lates, enfim conseguiu reiniciar o sistema.
“O Ruíndows está sendo finalizado”
- Graças a Deus!!! – agradeceu ela, que por pouco não dera um chute na “torre”.
“Salvando as suas alterações...”
- Que alterações? Tu não me deixou fazer na-da... im-be-cil! – desabafou.
(5 anos depois...)
“O Ruíndows está sendo desligado”
- Sério? Quando? Na próxima encarnação? – naquele momento de indignação e impotência frente à máquina, lembrou-se de uma charge que recebera meses antes: um desenho de um esqueleto humano sentado frente a um computador cheio de teias de aranha. Na tela, a mesma mensagem que agora contemplava: “O Ruíndows está sendo desligado”. Seria coincidência ela lembrar disso justo agora?
Achou melhor nem pensar a respeito, para não correr o risco de colocar fogo naquele hardware.
(10 anos depois)
“O Ruíndows está inicializando,”
- Será que se trata de uma questão de fé?
(+10 anos)
O Ruindows finalmente reinicia e logo volta a funcionar normalmente, rápido e competente. Nada como um bom Boot pra desopilar!
***
Ela seleciona um arquivo com o mouse e digita o atalho “SHIFT DEL”, para deletá-lo diretamente, sem que este fosse enviado a lixeira. [Trata-se de comando definitivo e que não cede a súplicas emocionais de arrependimento posterior]
“Você tem certeza de que deseja deletar o arquivo estajoçanaoservepranada.pps?”
- Sim!
“Se você deletar o arquivo estatralhasohocupaespaço.ppt, você nunca mais conseguirá acessa-lo. Você tem certeza?”
- Sim!
“Esta operação é irreversível, você está certo(a) disso?”
- Sim! (hunft)
“O arquivo minhapacienciaestaporumfio.vtf será apagado do mundo virtual para todo o sempre. Você está em plena razão para decidir isso?"
- Sim! (começa a cantarolar mantras)
“Tem certeza de que deseja continuar e de que este desejo é convicto?”
- Sim! (por pouco, quase não quebra a tecla ENTER)
“O arquivo deletaessamerdapelamordedeus.fdp vai ser apagado, clique em 'OK' para iniciar."
- OK! – a menina resolve abrir uma garrafa de uísque para evitar danos materiais.
“Se você continuar, o arquivo não poderá mais ser recuperado, uma vez que não será enviado à lixeira. Tem certeza absoluta de que deseja prosseguir?”
- Óbvio! – toma uma dose sem gelo - Acho que esse computador tem TOC! [=Transtorno Obsessivo Compulsivo]
“Clique em OK para mandar o arquivo pelos ares, ESC para Cancelar e F1 para mandar tudo à Ponte de Paris.”
- Isso só pode ser uma conspiração para me enlouquecer!
(depois de duas eras glaciais)
“O arquivo nemmelembromaisqualera.aje foi deletado com sucesso!”
Há essa altura, ela já estava em sono profundo - com a cabeça apoiada em cima do teclado, ao lado da garrafa de uísque vazia.
***
Tudo culpa daquele tal de Servidor...
(Outro dia, outro drama...)
Tudo parecia ir bem, até aparecer à mensagem:
“Ação Cancelada”
- Como assim? Eu não pedi pra cancelar nada... tá louco?!
Tela em branco, uma nova página da vébê ia começar a carregar, quando ela clica rapidamente no botão “voltar”, a fim de recuperar o trabalho que estava realizando na tela anterior. [esta parecia ser a solução mais sensata, já que o botão “parar” simplesmente ignorou suas dezenas de cliques]
A máquina trava por alguns segundos e enfim retorna a tela anterior.
Decepção total – ela perde todos os dados que ali havia inserido carinhosamente (e não era pouca coisa, não!). Toda a sua dedicação de uma tarde inteira simplesmente desapareceu, sem deixar rastros virtuais...
Ela paralisa por alguns segundos – talvez eternos em uma outra dimensão – enquanto a música ao fundo, tocava o refrão: Time goes by so slowly [= o tempo passa, tão devagar]
Nuvens negras aproximaram-se rapidamente, seguidas de um furacão... Enquanto ela permanece atônita, com um olhar de Serial Killer – pupilas flamejantes – coração acelerado - punhos cerrados – nó na garganta...
(pausa dramática + respiração profunda para reprimir o desejo instintivo de quebrar o seu micro em micro pedacinhos)
- Limite-se a fazer somente aquilo que EU mandar, ora bolas! – esbravejava ela, com ódio no coração, apontando seu indicador para o monitor.
- Máquina insolente... tá muito temperamental pro meu gosto... onde já se viu?! – tenta fazer piada da situação, para que sua frustração não custasse um computador novo (que também daria os mesmos problemas em um futuro próximo).
A menina coloca uma música zen para se acalmar e acaba por se conformar com a realidade: teria de começar todo o seu árduo trabalho do zero: tu-do de no-vo! (não havia outra opção, independentemente da sua vontade)
Ao tentar começar a digitar de novo na dita página da vébê, esta trava outra vez, e logo em seguida lhe exibe uma mensagem bizarra:
“Infelizmente, o servidor do suavidadependedemim.com se comportou de forma inesperada. Esperamos que ele volte ao seu estado normal quando você tentar novamente em alguns minutos.”
- Como é que é? – sem acreditar no que estava lendo, novamente respirou fundo - em busca do ar perdido - e continuou a ler, preparada para o pior...
“É provável que o servidor tenha esse comportamento durante os próximos meses. Pedimos desculpas pelo transtorno e pela falta de consideração do nosso servidor”.
- Bad Server! Bad Server! (servidor mau!) – debochava ela, enquanto internamente filosofava acerca da última frase dessa mensagem de erro ab-surrrrr-da: ...”falta de consideração do nosso servidor” (??)
- Meu Deus! Falam como se o servidor fosse um ser dotado de características plenamente humanas... e rancoroso ainda por cima! Por um acaso estamos vivendo numa Matrix? – divaga ela, ao lembrar-se da sua última aula de filosofia: "mesmo quem está na Matrix pode, sob certas condições, ter conhecimento empírico".
Após alguns segundos nesta dimensão, ela opta por abanadonar suas reflexões e tentar retomar seu trabalho - mais uma vez. No entanto, aquela mensagem de erro surreal parecia persegui-la.
“Infelizmente, o servidor do suavidadependedemim.com se comportou de forma inesperada...”
- Cada uma! Nunca pensei que alguém, ou alguma coisa, pudesse pedir desculpas por uma outra coisa - que não se sabe o que é exatamente, exceto que é uma máquina... ao menos se acha que é uma máquina...
- Uma máquina dominada por softwares incompreendidos... (completou)
Melhor deixar esse computador com crise existencial relaxar! - Conclui a menina, que também resolve se deitar. Preferiu refazer seu trabalho no dia seguinte, com as energias renovadas. Ela também precisava de um boot – que durasse a noite inteira...
“Afinal, quem é o Poder dominante nessa relação Homem-Máquina?” – adormeceu com este pensamento...
A Máquina, no entanto, definiu a sua rotina do dia seguinte... ou, talvez, a dos próximos dias...
*Foto Reflexão: Será que esse tal de Servidor é um homem-máquina, tipo Dart Vader? Um ser do mau, metade homem, metade máquina...?
2 comentários:
Ahahahahahahhaahah!
Exelent!
Nunca me esqueço de uma vez que tu me disse que o 'Ruindows' nasceu para ser formatado de tempos em tempos!
Rsssss!
Bjs!
Oie, descobri teu blog por acaso, através da dessa imagem e doutro "do homem com zíper na boca". Gostei demais desse texto sobre tecnologia, trabalho com isso. Vou usar a imagem deste teu post pra indicar filmes que tratam de tecnologia e educação. Parabéns pelo blog. Um abraço. Zé Roig.
http://letravivadoroig.blogspot.com
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